então aquilo era… um pênis!?!

Agosto 29, 2009 § 17 comentários

Parece que era sim. Mais especificamente um dos maiores pênis que a natureza já produziu: o pênis de uma baleia!

Estou falando de um artigo publicado pelo biólogo marinho Charles Paxton no periódico Archives of Natural History propondo uma explicação bem simples para um mistério que atravessou séculos.

Para quem não sabe, Paxton ficou famoso em 2002, quando recebeu o prêmio Ig Nobel de Biologia por seu estudo sobre o comportamento de cortejo de avestruzes em relação a humanos. Vê-se então que o figura cientista já tem currículo na área. Clique aqui para ler uma entrevista concedida por ele à revista Ciência Hoje e conhecer um pouco mais sobre seu trabalho.

Mas voltando ao artigo, o contexto é o seguinte: em 1734, o missionário Hans Egede publicou um relato que ficou famoso na coleção de histórias sobre “serpentes do mar” descrevendo um “monstro terrível” avistado perto da costa da Groenlândia. Ao longo dos séculos, várias explicações foram sugeridas para a observação, como a de que os marinheiros poderiam ter confundido os tentáculos de uma lula gigante com a cauda do “monstro terrível”. Mas eis que entra Charles Paxton em cena com uma hipótese bem mais interessante: os marinheiros podem ter visto um pênis de baleia.

Os órgãos sexuais das baleias, bem como dos demais mamíferos marinhos, são introvertidos, ou seja, ficam no interior do corpo e são extrovertidos apenas no momento da cópula. Essa é uma adaptação importante apresentada por esses animais que lhes confere um corpo mais hidrodinâmico e facilita a natação. Quando extrovertido, o pênis de uma baleia pode chegar a cerca de dois metros de comprimento —  e ser facilmente confundido com a cauda de uma “terrível serpente marinha”.

Mas, como se diz, uma imagem vale mais que mil palavras. Então tirem suas próprias conclusões a respeito da proposta de Paxton depois de analisar a imagem abaixo:

Dois machos da baleia cinzenta (Eschrichtius robustus) em comportamento de corte (!). Não se sabe se apenas um deles conseguiu penetrar a fêmea ou se acabaram se entendendo em um ménage à trois. (Fonte: http://www.oceanlight.com)

Dois machos de baleia cinzenta (Eschrichtius robustus) em comportamento de corte com uma fêmea. Não se sabe se apenas um deles conseguiu penetrar a fêmea ou se acabaram se entendendo em um ménage à trois. (Fonte: http://www.oceanlight.com)

No artigo, Charles Paxton e colaboradores compararam o “monstro terrível” descrito e ilustrado por Hans Egede com as espécies de cetáceos que podiam ser encontradas no Atlântico Norte no século XVIII. A análise levou os pesquisadores a uma lista de três “monstros possíveis”: uma baleia jubarte (Megaptera novaeangliae), uma baleia franca do Atlântico Norte (Eubalaena glacialis) ou uma baleia cinzenta (Eschrichtius robustus).

Como a observação do comportamento de cópula entre esses animais não é muito frequente (veja mais informações no próximo bloco de texto), os pesquisadores argumentaram no artigo que mesmo os navegantes mais experientes e conhecedores desses animais poderiam não ter identificado seu pênis simplesmente por nunca terem visto um (de baleia, claro).

rb2_large_grayReferência (pdf):

C. G. M. PAXTON, E. KNATTERUD and S. L. HEDLEY (2005). Cetaceans, sex and sea serpents: an analysis of the Egede accounts of a “most dreadful monster” seen off the coast of Greenland in 1734 Archives of natural history, 32 (1), 1-9

(Atualização em 31/08/09: O Kentaro Mori, do 100nexos, também já escreveu sobre esse artigo há um tempo atrás. Quem se interessar, pode checar aqui e ver trechos traduzidos do artigo de Paxton e também reproduções dos desenhos de Egede)

Voyerismo científico

Um dos métodos utilizados pelos cientistas que estudam os cetáceos, geralmente os biólogos e os oceanólogos, é a observação comportamental. Há diversas formas de classificar o comportamento observado, o tempo de duração de cada comportamento e outros parâmetros, os quais são combinados em análises estatísticas e provêem informações sobre a espécie ou grupo em estudo.

De todos os comportamentos apresentados pelos cetáceos, a cópula é dos mais difíceis de ser observado. Nem tanto porque esses animais preservem sua privacidade, mas é que qualquer animal em situação de cópula converte-se em presa fácil. Assim, tão logo percebam alguma aproximação estranha, a cópula é interrompida. É por essa razão que os cientistas ficam muito excitados quando conseguem presenciar uma cópula entre os cetáceos. Veja nessa reportagem da Revista Galileu o relato de um privilegiado oceanógrafo que pôde observar tudinho entre as baleias minke na altura do litoral da Paraíba.

Uma coleção de pênis

Outra estratégia frequente utilizada pelos cientistas consiste na coleta de exemplares pra estudo, comparação e classificação. Os exemplares coletados muitas vezes são reunidos em coleções ou museus. Foi o que fez o historiador Sigurdur Hjartarson, que construiu na Islândia o Museu Falológico, mais conhecido como museu do pênis, depois de colecionar dezenas de pênis de diversos mamíferos naturais da região (tem um critério, viram só que científico?).

Visitante admira os exemplares do Museu Falológico irlândês. (Fonte: http://www.phallus.is)

Visitante admira os exemplares do Museu Falológico irlândês. (Fonte: http://www.phallus.is)

O Museu Falológico possui uma coleção de cerca de 200 pênis distintos. O acervo é composto por todos os tipos de exemplares: desde o pênis de um hamster, que mede menos de dois milímetros e precisa do auxílio de uma lupa para ser visto, até os de gambás, carneiros, golfinhos e cavalos. Mas a sensação, como vocês já devem imaginar, é o pênis de uma baleia, que mede cerca de dois metros de comprimento.

O pênis de uma baleia é o exemplar mais avantajado à disposição dos visitantes no Museu Falológico irlandês. Ah, importante: não pode tocar! (Fonte: http://www.phallus.is)

O pênis de uma baleia é o exemplar mais avantajado à disposição dos visitantes no Museu Falológico irlandês. Ah, importante: não pode tocar! (Fonte: http://www.phallus.is)

Veja mais fotos e informações sobre o museu no site do próprio ou nessa reportagem do G1 (que registrou o criativo colecionador ao lado do pênis de um elefante – será o seu preferido?).

Festival do pênis

Achou que as bizarrices paravam por aí? Pois enquanto no Museu Falológico um exemplar em falta é justamente o de um pênis humano, no Japão é organizado um festival específico para ele. Trata-se do Festival do Pênis, cuja atração principal é uma procissão com o pênis gigante da foto abaixo. Os japoneses acreditam que esse ritual traz sorte às mulheres que querem ter filhos. Faz sentido, né? Veja mais fotos e informações nessa matéria no G1.

Procissão com o pênis gigante, que é respeitavelmente carregado em um pequeno mikoshi. (Fonte: G1)

Procissão com o pênis gigante, que é respeitavelmente carregado em um pequeno mikoshi. (Fonte: G1)

Por trás

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§ 17 Responses to então aquilo era… um pênis!?!

  • trnahas diz:

    Há pouco eu li o post do Takata no Gene Repórter sobre essa blogagem coletiva (http://genereporter.blogspot.com/2009/08/cacando-paraquedistas.html) e fiquei relendo esse post aqui e pensando no que o Roberto tinha dito. Daí quase postei uma resposta pra ele lá, mas achei que ele poderia pensar que eu estava sendo meio brava, sei lá, e resolvi não postar pq a intenção não era essa. Mas preciso me expressar, então vou usar meu blog mesmo :) (mas Roberto, se vc ler isso, lembre do que está acima, purfa!)
    Então, verdade o que ele falou… análise é perfeita. Eu fiquei pensando enquanto lia “já que a proposta é caçar paraquedista, seria uma abordagem mais científica fazer o que ele falou, mas não seria tão… tão o quê?… tão divertida de se fazer!”
    O quê? Estou dizendo então que a ciência não pode ser divertida?!?
    Na-não! Basta lembrar do exemplo do neurocientista Miguel Nicolelis (http://www.natalneuro.org.br/imprensa/). Ele sempre conta a historinha da pergunta dos colegas em um congresso. Ele apresentou os detalhes do experimento em que uma interface cérebro-motora garantia que os movimentos de uma macaca andando nos EUA fossem reproduzidos por um robô no Japão, a primeira interface cérebro máquina transcontinental e que precisou que se criasse uma internet específica para transmitir seus dados. Então foi perguntado pq cargas d’água ele resolveu fazer o troço transcontinenteal, se a beleza e a importância da essência do que ele conseguiu demonstrar com o experimento seriam as mesmas se robô e macaca estivessem lado-a-lado ou na sala de frente da outra. Ao que ele respondeu: “algumas coisas a gente faz… just for fun” :)

  • Fernanda diz:

    Oi!

    Esse foi um dos teus melhores posts! Muuuuito bom!

    Sobre o post do Takata, a primeira coisa que me ocorreu foi justamente fazer uma busca das palavras mais procuradas na internet para montar meu post (onde procurei atrair o público feminino, como ficou meio evidente).

    Nesse processo, descobri que o google, yahoo etc fazem uma lista das palavras mais procuradas tirando os termos mais, digamos, pesados. Então, se a sua palavra-chave for “sexo” é garantido que a busca será maior que “jogos” ou “orkut” – isso só não é oficialmente divulgado.

    E era meio óbvio que a galera usaria esse “viés” para caçar paraquedistas. Afinal, as pessoas podem até disfarçar, mas quem não tem seu interesse despertado quando o assunto é sexo? :-D

    Abraço,

    Fer

    • trnahas diz:

      Oi, Fer
      Obrigada! Eu adorei a brincadeira :)
      Sobre as buscas no Google… por enquanto já chegou por aqui quem se interessou por “penis monstros” e “fotos de penis excitados” :)
      Beijo,
      Tati

  • trnahas diz:

    Cefaléia orgásmica, já ouviu falar? Explicação científica com referências aqui: http://www.dol.inf.br/html/editorial.html

    Se eu tivesse visto esse artigo antes, talvez tivesse escrito outro post para a blogagem coletiva :)

  • Mori diz:

    Eu escrevi sobre o tema no CeticismoAberto na época http://www.ceticismoaberto.com/news/?p=54
    Valia um link, não?

    • trnahas diz:

      Oi, Kentaro!
      Coloquei uma atualização no post com o link pro seu texto. Gostei da comparação com os desenhos da época!!
      Obrigada pela visita!
      Abração,
      Tatiana

  • Oi, Tati,

    Por que eu pensaria que você estaria brava?

    Fernanda, não me parece que o Google oculte ou omita as buscas por “sexo” ou palavras relacionadas. Entre as palavras mais buscadas nos EUA para o dia 31 de agosto, estão “leah lust”, uma atriz pornô (sexto lugar – logo atrás da história do rapto de jaycee dugard). Em primeiro lugar está “what s the difference between peanut butter and jam” (aparentemente a série How I met your Mother da CBS faz algum sucesso na terrinha do tio Sam).

    []s,

    Roberto Takata

    • trnahas diz:

      Olá, Roberto!
      Não fiz nenhuma análise aprofundada, mas tomando por base como as pessoas chegam aqui (de que links vieram e/ou de que termos de busca – pelas estatísticas do WordPress) dá pra ver que o Google procura tranquilamente tudo e mais alguma coisa sem ocultar ou amenizar nadinha :) Então vc tem razão no teu comentário.
      Por outro lado, passada um pouco a super empolgação inicial da diversão de fazer o post e de ficar acompanhando o resultado, não estou tão convicta de de estamos caçando os paraquedistas. Acho que estamos só chamando sua atenção sem grandes desdobramentos. Que eles vêem o post “diferente”, lá isso vêeem. Esse é de longe o post mais visitado de todos os tempos aqui no blog, sendo que é também dos mais recentes. Mas poucos visitantes que chegaram por essa via vão além dele, a discrepância entre a visita a esse post e aos demais é enorme :(
      Enfim, dados pra tornar essa caçada mais aproveitável na próxima rodada em termos de aprimoramento do blog. A outra opção é descambar de vez pro cienciacionalismo, mas vou tentar botar minha criatividade pra jambrar um pouco antes :) Aceita-se ajuda, sugestões, puxões de orelha etc
      Abração!
      Tati

  • Verdade, Tati, segurar a audiência é que o xis da questão. (Também pensei nas consequências do sensacionalismo. Até por isso não adentrei na proposta da blogagem – como vivo metendo o pau nos jornalistas que usam desse recurso, especialmente, mas não só, nas áreas de ciências, seria um contrassenso eu me valer disso. O que não quer dizer que eu não aborde alguns temas por, como você mesma disse, “pura diversão”.)

    []s,

    Roberto Takata

  • trnahas diz:

    Eu eu que tive dificuldade em encontrar um assunto pra participar da blogagem coletiva… Depois achei mais um que daria pano pra manga (esse da cefaléia orgásmica mencionado acima) e agora… mais um: “a woman’s history of vaginal orgasm is discernible from her walk”. É cada uma…
    Curiosos podem ler mais aqui e, inclusive, ter acesso ao resumo do artigo científico publicado: http://www.ncbirofl.com/2009/09/womans-history-of-vaginal-orgasm-is.html

  • Nina diz:

    Hahaha, Tati, mandou muito bem nessa série sobre os pênis! Salvem as baleias e seus bilaus avantajados. Imagina a quantidade de ideias bizarras que não devem estar brotando na cabeça de algumas mulheres que curtem um sexo animal…
    Beijo,
    Nina
    (Ainda bem que as baleias não usam camisinha, senão, ia sair bem caro pra elas…)

    • trnahas diz:

      Salve, Ninotchka, figura!
      Que bom te receber aqui no blog!
      Sabe que o bilau da baleia tá dando ibope? :) Mas o que eu achei mais engraçado de tudo foi o Museu Falológico; olha a idéia que o cara tem! Será que a Gabi já foi visitar? Precisamos perguntar pra ela.
      Beijo, nêga!

  • Hi,

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  • trnahas diz:

    Esse post também é sensacional => RT @oatila (Atila Iamarino) Dois machos bem dotados (1 tonelada de testículos e 2 metros de membro) e uma fêmea, ménage de baleias: http://j.mp/eLRn9R

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