mais biologia sintética

Dezembro 5, 2011 § 7 comentários

No post anterior, mencionei meu entusiasmo recente pela biologia sintética, provocado principalmente por uma conferência incrível a que tive oportunidade de assistir em setembro durante a abertura do Congresso Brasileiro de Biossegurança. O palestrante era Andrew Hessel, da Singularity University, uma instituição localizada no centro de pesquisa da Nasa no Vale do Silício.  Criada há 3 anos com o objetivo de treinar pessoas em fast moving technology, tem a engenharia genética como uma das principais áreas de investigação e, claro, a biologia sintética como o mais recente e promissor desdobramento.

O esquema abaixo, apresentado por Hessel em sua conferência, mostra uma possível equivalência entre a hierarquia observada na engenharia computacional e uma para a biologia sintética. E resume bem a ideia de manipulações moleculares, que interferem no metabolismo celular, a partir de intervenções diretas no “código-fonte” da vida, o DNA.

Andrianantoandro, E.; Basu S.; Karig D.K.; Weir R. Synthetic biology: new engineering rules for an emerging discipline. Molecular Systems Biology, 2, 2006. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/16738572

A partir do uso de “peças Lego da biologia sintética”, disponíveis em bancos como o da Do-It-Yourself Biologist e da BioBricks Foundation, novas estruturas celulares e mesmo organismos inteiros podem ser sintetizados. De acordo com Hessel, tudo que hoje é feito quimicamente, como combustível, plástico e fertilizantes, poderá ser feito bioquimicamente.

E muito já se tem feito. O próprio Hessel, por exemplo, esta à frente de uma cooperativa open source com objetivo de mudar o paradigma biotecnológico do tratamento do câncer por meio da biologia sintética (Pinky Army Cooperative). Outra iniciativa interessante é a competição em biologia sintética voltada a estudantes (International Genetically Engineered Machine CompetitioniGEM), patrocinada por importantes instituições de desenvolvimento científico e tecnológico, como o MIT, a Nasa, a National Science Foundation e a Biobricks Foundation.

Um grupo de estudantes da USP, candidato à próxima versão da competição iGEM, vem escrevendo um blog que se converteu rapidamente em uma excelente fonte sobre biologia sintética em língua portuguesa. Com informação qualificada e acessível para não especialistas, o SynbioBrasil é um ótimo ponto de partida para conhecer o básico sobre biologia sintética e se manter atualizado a respeito dos avanços da área.

Este infográfico elaborado pela revista Seed Magazine também é um bom ponto de partida, assim como o vídeo abaixo, realizado pela Universidade de Bristol.

Frente ao magnífico avanço dessa nova vertente da biotecnologia, o que ainda esta incipiente é o debate ético e o relacionado à biossegurança, como bem colocou Paul Roote Wolpe na Ted Talk que já virou post aqui no blog. O recém criado Virtual Biossecurity Center é uma importante iniciativa no sentido de estabelecer uma rede entre cientistas, educadores e governantes que podem colaborar para o desenvolvimento de uma “biotecnologia responsável”. Quanto a isso, assino embaixo da frase de Hessel no encerramento de sua conferência: Training young people is the best security system.

de biologia e tecnologia

Dezembro 4, 2011 § Deixe um comentário

Como prometido, segue a íntegra da minha coluna escrita para a segunda edição da Revista Quanta.

Dessa vez, falo um pouco sobre biologia sintética, inspirada pelo evento satélite do VII Congresso Brasileiro de Biossegurança, organizado pela Anbio. Fiquei encantada pela área, especialmente cativada pela excelente conferência de abertura proferida por Andrew Hessel, da Singularity University. No próximo post amplio um pouco o papo sobre o tema e indico alguns ótimos links para quem quiser conhecer um pouco mais sobre a área.

Por enquanto, seguem os links para os estudos mencionados na coluna:

a terceira evolução

Setembro 16, 2011 § 1 Comentário

Dá o que pensar essa palestra do bioético Paul Root Wolpe!

Após defender a ideia de que estamos vivendo a era da terceira evolução, ou evolução projetada (evolution by design), Paul traça uma retrospectiva dos recentes estudos em bioengenharia e biologia sintética. Já no final, um pouco dos mitos tradicionais: passa pela capa da The Economist que divulgou o genoma sintético de Craig Venter como se fosse criação da vida pelo homem e arremata com a clássica comparação com o laboratório de Frankestein.

A palestra foi proferida em novembro de 2010, então agora Paul já teria mais um dado a adicionar à sua linha do tempo da terceira evolução, afinal ontem foi anunciada a primeira célula eucariótica com um par de cromossomos sintéticos. A pergunta que lança ao final segue válida e cada vez mais urgente: projetar organismos já é realidade, não é mais ficção científica; já não era hora de debatermos a sério a ética e a regulamentação desses procedimentos?

via @SymbioBrasil.

atualidades biológicas fresquinhas- III

Novembro 27, 2010 § 1 Comentário

Dando continuidade à série atualidades biológicas fresquinhas para os vestibulares 2010, o tema desse post é biotecnologia.

Seguem abaixo o conjunto de slides de uma aula que montei para alunos do ensino médio e alguns links para aprofundamento sobre o tema.

a bactéria sintética de Craig Venter

Maio 23, 2010 § 13 comentários

O vídeo abaixo apresenta o anúncio oficial, feito por Craig Venter esta semana, da nova peripécia conseguida por seu grupo de pesquisa. Trata-se de um divisor de águas na história da pesquisa biológica, da mesma forma que a clonagem da ovelha Dolly em 1997.

Entenda o que foi feito

Para quem não se lembra, Craig Venter ficou famoso na “corrida do genoma”: na década passada, ele liderou um esforço privado de sequenciamento do genoma humano (o dele próprio), em paralelo ao sequenciamento que estava sendo feito por um consórcio público (Projeto Genoma Humano).

Do genoma humano à bactéria sintética, foram diversos anos de pesquisa de ponta com uma pitada de ousadia (conheça um pouco sobre o trabalho de Venter em texto seu para a Seed Magazine)

O anúncio desta feita veio após um trabalho de mais de 10 anos: a equipe de Venter inseriu um genoma sintético (uma modificação do genoma da bactéria Mycoplasma mycoides) dentro de uma bactéria (Mycoplasma capricolum)  sem genoma e conseguiu fazer com que essa bactéria passasse a obedecer os comandos do genoma recebido.

Venter fez uma analogia entre este trabalho e operações de computação: o que a equipe fez foi trocar o “software” do sistema operacional e fazer um computador inoperante voltar a funcionar.

Atualização em 20/06/2010: substituí o infográfico anterior por este (fonte: Pesquisa Fapesp, jun/20120), mais completo e que não carrega o erro conceitual que havia sido apontado.

O que isso significa?

Um pequeno genominha sintético extremamente simples e mais um grande passo para a biologia molecular.

As aplicações da técnica de inserção de genomas artificiais em bactérias, segundo o próprio Venter, são muitas. Há a possibilidade de desenvolver bactérias sob medida para produção de biocombustíveis, absorção de gás carbônico da atmosfera e outros resíduos tóxicos de nossa produção industrial, além da manufatura de vacinas.

O próximo passo dessa linha de pesquisa, de acordo com ele,

é entender a natureza básica da vida, quais são os conjuntos de genes mínimos necessários para ela. Ainda não sabemos todas as funções de genes presentes em uma célula. Trata-se, portanto, de um enigma fundamental. (veja entrevista de Venter ao jornal The Independent e traduzida no jornal O Globo)

O biólogo Rafael Soares (no blog RNAm) e a geneticista Mayana Zatz (em entrevista ao Jornal Hoje – vídeo) teceram importantes considerações sobre as reais perspectivas a partir desse feito. Clique nos links e entenda porque o “frisson” em voga sobre a criação de vidas artificiais é um tanto de exagero dos angustiados de plantão, começando pela percepção de que não foi, de fato, criada “vida artificial” como se está espalhando por aí e como foi sugerido no título do artigo de Venter na Science com o uso da palavra creation.

Sim, o debate sobre biossegurança e ética é válido e necessário, mas tanto quanto o é para os transgênicos (organismos geneticamente modificados), as células tronco, a clonagem reprodutiva etc. Como bem disse Mayana, toda pesquisa pode ter boas e más aplicações. Seguimos os estudos para desenvolvimento das boas e estabelecemos regulamentações que impeçam as más.

Para não tropeçar nos conceitos

  • genoma: é o conjunto de moléculas de DNA de uma espécie. Isso inclui tanto os genes, como as sequências não codificadoras do DNA (que até pouco tempo atrás eram erroneamente conhecidas como “DNA lixo”).
  • código genético: o uso errôneo do termo “código genético” é comum na imprensa leiga no Brasil e no mundo. Essa expressão é, geralmente usada em lugar de “sequência genética”. Mas qual a diferença? O código genético consiste na correspondência entre uma trinca de bases nitrogenadas do RNA mensageiro (códon) e um aminoácido por ela codificado no processo de tradução de uma proteína. Já sequência genética é a sequencia de bases nitrogenadas no DNA, ou seja, exatamente o que é identificado quando se anuncia que o genoma de alguma espécie (do homem, da Xylella fastidiosa, do boi etc) foi sequenciado.

Leia mais

Atualização em 24/05/2010: Está muito bacana a linha do tempo interativa sobre estudos do genoma que o Estadão publicou em abril por ocasião dos 10 anos do Projeto Genoma Humano. Vale a revisão agora que já temos um novo marco a acrescentar nessa linha. Via Miriam Salles.

Atualização em 28/05/2010: Imperdível o muito didático post de Roberto Takata em seu blog Gene Repórter: Vida sintética e artificialismos.

Atualização em 20/06/2010: Estão ótimos os quatro artigos sobre esse DNA sintético publicados na revista Pesquisa Fapesp desse mês:

Where Am I?

You are currently browsing the biologia sintética category at ciência na mídia.